É manhã, estou no escritório, pernas em cima da secretária e cigarro aceso na boca. Mais um dia ignóbil à espera de sexta-feira. Aproveito para praticar o meu desporto matinal: ouvir a barba crescer. Os processos continuam a empilhar-se na mesa ao lado do telefone. Mais um dia ignóbil e o milagre não se deu, os processos não se resolveram a si próprios. Uma mosca irritante (existem outras?) começa a sobrevoar o meu espaço aéreo. Qual é a finalidade deste bichos? O que é que Deus tinha em mente? Os Bzzz da mosca confundem-se com o som da barba, que por esta altura cresce a uma velocidade vertiginosa. Crssshhh faz a barba quando cresce, Bzzzz faz a mosca quando passa, reparo que os dois sons misturados criam uma espécie de beat jazzístico agradável. Mais processos, parece que, além de não se resolverem sozinhos, ainda se reproduzem. Abano o pé ao ritmo do swing da mosca e da barba. Tento equilibrar a cinza no cigarro e penso: porque ruminam as vacas? Que espécie de compromissos pode uma vaca ter para comer à pressa? A inércia pesa-me tanto que mesmo que quisesse levantar-me não conseguia. Um dia destes alguém vai abrir a porta, afastar os processos empilhados até ao tecto e descobrir um esqueleto aborrecido de beata na boca. Esta ideia assusta-me tanto que tomo uma atitude radical, levanto-me, mato a mosca e vou à pressa comprar gillettes.
Compreendo as cabras quando comem à pressa, têm que fugir dos pastores.
Compreendo as cabras quando comem à pressa, têm que fugir dos pastores.
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