Abrenuncio deitou-se na areia e, como há erros que são para
repetir, deixou-se dormir ao sol.
Sonhou-se numa ilha do Pacífico,
a sul do Taiti, a norte da Nova Zelândia. Um bom sítio para ser desterrado,
pensou, já que temos que sair do país que seja em estilo. Como teria ali
chegado? Talvez tivesse naufragado – é sempre romântico naufragar - ou talvez o seu avião se tivesse
descontrolado, perdido o controlo de um dos motores, os flaps tivessem
emperrado, e ali se despenhasse.
Os indígenas rodearam-no com
curiosidade. Inspecionaram-no como se de um cavalo se tratasse; abriram-lhe a
boca para ver os dentes, deram-lhe pancadas no lombo, puxaram-lhe o cabelo…
Pelas tatuagens faciais faziam lembrar os Maoris. Talvez fossem
ascendentes destes; alguma tribo perdida que, interrompendo a longa travessia
para sul, cansada se ficara por ali. Apresentavam todo o aspecto de serem uma
daquelas tribos do Pacífico, que ouvimos falar no National Geographic e nos
romances de viagem; daquelas que possuem o estranho hábito de se alimentarem,
não exclusivamente, mas também de carne humana. Abrenúncio retraiu-se com a
ideia.
Entre eles, havia um escanzelado,
que arranhava um inglês macarrónico, não sou portanto o primeiro ocidental a chegar
aqui, cogitou Abrenuncio.Trazia um
crucifixo ao pescoço que partilhava a atenção com uma orelha humana que se
dependurava do mesmo colar.
Quem lhes ensinou o inglês devia
ser missionário e não lhes matou só a fome espiritual – concluiu.
- Dond és tu vens? – Inquiriu o Maori.
- Sou Abrenúncio, venho do
Algarve.
- Nunci Al’arve – retorquiu o
outro.
- Não, não – corrigiu – A-b-r-e
núncio do Al-Garve. Soletrou devagar.
- N-un-ci, Al’Arve – Respondeu o
outro vagarosamente.
- Al-Garve: é árabe!
- Al’Arve é Rábe.
- SÓ ALGARVE!!! – Exaltou-se Abrenuncio.
- SÓ AL’ARVE – Gritou o
escanzelado e virando-se para os outros designou Abrenúncio.
- SÓ AL’ARVE - SÓ AL’ARVE - SÓ
AL’ARVE - SÓ AL’ARVE – gritaram todos em alegre euforia carregando-o sobre
ombros em direcção à aldeia, não sabendo Abrenuncio se o estariam a
convidar para jantar ou se estariam contentes por terem encontrado o jantar
5 comentários:
3 de setembro de 2012 às 12:42
Ai os sonhos a tornarem-se pesadelos!
3 de setembro de 2012 às 12:58
estou tão contente de ter encontrado este blogue. adoro-o.
3 de setembro de 2012 às 14:15
E nós adoramos-te também, nAnonima.
3 de setembro de 2012 às 19:18
El Matador, és um doce.
Belo post.
:)
5 de setembro de 2012 às 22:16
obrigado, desejo
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