Jogava sempre com duas
chaves e os resultados saíam-me sempre ao lado. Eu explico, saía sempre
o número ao lado daquele que eu escolhia. Cedo delineei um método
infalível baseado nesta minha descoberta teórica da lateralidade:
comecei então a jogar com três chaves. A primeira e original, a
segunda só com os números ao lado da primeira e a terceira com os
números ao lado da segunda. Não por sorte ou azar, por sarcasmo
apenas, digo eu, começaram a sair os números ao lado dos números
ao lado do números ao lado. Seria o destino a rir-se de mim?
Eu, um não crente da
providencia, um apostador do caos, de imediato urdi um plano para
fintar a aparente ironia poética desse tal destino parvalhão. Optei
pelo cerco, a jogada mais paciente ainda que aparentemente
desesperada: joguei com uma chave ao centro e as outras com os
números todos à volta. O boletim era um massacre, havia cruzes por
todo o lado. Nada! Gastei uma fortuna, duas até, e não me saiu
nada. Cheguei a comparar-me com aquele homem da
televisão que apostava sempre no vermelho e saía-lhe sempre o preto.
Deixar de jogar era fácil, e talvez uma das melhores coisas que
faria na vida, o meu médico havia de gostar, mas não me conformo.
Estou obcecado, tem de haver uma saída, as combinações são incontáveis mas não são infinitas; é só apostar ao lado do lado do lado do
lado do lado... A ansiedade só por
si é o suficiente para me matar. Mas não pode ser, tenho que
continuar, estou viciado. Sou um masoquista ao fim de contas. Um dia
pode ser que me canse