Certa vez, de visita a uma cidade do estrangeiro, Zeferino deparou-se com um pedinte que lhe despertou a atenção. Foi na escadaria que levava ao Castelo; prostrado de joelhos, com a testa afundada nos antebraços e as palmas das mãos em concha viradas para cima. Não falava e não se mexia um centímetro que fosse, deixava-se estar apenas, em silêncio, como se pedisse clemência, num acto de tal abnegação que intrigava quem passava: estaria a pedir esmola, ou estaria a pedir perdão? As pessoas, intrigadas, seguiam caminho; receavam que ao deixar a esmola o pudessem despertar de tão profunda meditação.
Horas depois, já na vinda para baixo, Zeferino foi encontrar o homem no mesmo sítio na mesmíssima posição, como se o tempo não tivesse passado por ele, como se duma estátua se tratasse, como se não estivesse vivo. Uma diferença apenas: na concha das mãos aninhavam-se algumas moedas, alguém já tinha feito a experiência e confirmado a tese, era mesmo um pedinte.
Hoje, ao passar por uma esplanada, onde um grupo de senhoras trincava pastéis de nata polvilhados de canela, Zeferino, numa associação de ideias transviadas lembrou-se do mendigo estrangeiro:
- Um dia destes havemos estar todos como o pedinte – pensou – Uns de joelhos, outros a pedir esmola.