- Ainda vais gostar de mim quando eu for gorda e careca? – súbita questão feminina.
Era Zubaida quem inquiria. Labregoísio estremeceu: seria esta uma pergunta armadilha? Daquelas artilhadas para pensarmos que o desarmamento é possível; daquelas que nos levam a pensar que a resposta é só cortar o cabo vermelho no último segundo e estamos safos.
A última vez que cortara esse cabo vermelho à confiança, todo o mau feitio de Zubaida explodira-lhe em cheio na cara. Ficou um mês a pão e água, no sofá, com os cães e um cobertor. Agora que tudo voltara à normalidade, que os tratados de paz conjugais haviam sido assinados, que nada de novo havia a oeste do quarto de dormir; eis que Zubaida larga um engenho de consideradas dimensões no hall de entrada.
- Estou à espera – Insiste Zubaida. A contagem decrescente inicia-se. Labregoísio olha para o relógio digital preso ao dispositivo da questão, que presumia ser explosiva, e também ele se liquefaz em rios de suor. Avaliando rapidamente o tamanho e peso da coisa, Labregoísio chega à conclusão que é todo o prédio, senão mesmo o bairro, que está em perigo. Não existe portanto, margem para erros de linguagem, gaguejos ou evasões floreadas.
Do painel principal da bélica interrogação, Labregoísio sabe que tem que evitar a todo o custo os fios vermelhos da gordura e os castanhos da calvície, restando apenas os azuis de neutralidade incógnita. Que fazer? A contagem decrescente, em vermelho implacável, parecia acelerar: 8,7,6,5…Labregoísio descarna os cabos azuis e dá-se conta que a única solução será executar um bypass de charme…4,3,2,1…
- Minha flor! Quando fores gorda, se isso chegar a acontecer, o que não me parece possível, haverá nesse caso mais mulher para amar. E então, como careca já eu sou, seremos o casal perfeito: duas almas gémeas em dois corpos espelhados.
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