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O Palhaço

| quinta-feira, 2 de julho de 2009 | |

Quando o palhaço Anacleto foi atropelado, o condutor seguiu caminho sem lhe prestar qualquer auxílio. Anacleto espalhado pelo chão tingia de vermelho a passadeira, conferindo-lhe um aspecto tricolor tão próprio do mundo circense. Como tinha tempo para isso, meditou sobre a sua vida de saltimbanco que agora parecia chegar a um término antecipado. Viu o sorriso das crianças nas longas tardes de espectáculo e os tombos propositados que tomava por causa delas. Lembrou-se dos elefantes e dos trapezistas, dos funâmbulos e especialmente das contorcionistas. Uma vez apaixonara-se muito à parva por uma contorcionista chinesa, mas esta padecia de amores pelo Magnífico Lambrini – o Mágico de serviço. Desgostado correu o mundo na sua roulotte, de palhaçada em palhaçada, pintando a dor de alegria, forçando gargalhadas nos outros.
As pessoas começaram a aglomerar-se à sua volta, como sempre acontece nos acidentes trágicos. Ao longe, muito ao longe, já se descortinava o tinóni da ambulância que o iria levar para a última morada; sim, ele sabia que estava de saída.
Nos últimos momentos pensou em como gostaria de ter confessado a alguém que, a morte acidental do Magnífico Lambrini não tinha sido nada acidental. A reminiscência desprendeu-lhe um último sorriso e assim se ficou, sorrindo, como só os palhaços tristes sabem. Como não estava pintado ninguém o reconheceu.

4 comentários:

roserouge Says:
2 de julho de 2009 às 23:55

Isso quer dizer que o Anacleto vai desaparecer? Não pode ter partido só uma perna? Tomaste-lhe o pulso? Vê lá melhor...

El Matador Says:
3 de julho de 2009 às 08:28

Rose, o Anacleto Palhaço e o outro Anacleto são seres completamente diferentes. O nome foi uma infleiz coincidência, se bem que o outro Anacleto, de vez em quando, se arme também em palhaço.

Post Mortem Says:
3 de julho de 2009 às 10:06

ontem vi o palhaço do Albert John Garden...
foi engraçado...

El Matador Says:
3 de julho de 2009 às 10:25

Esse não precisa de se pintar.