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É Agora

| quarta-feira, 29 de julho de 2009 | |

No meio de tanto desespero, encheu-se de coragem e resolveu matar-se. Assim mesmo, sem mais nem ontem. Pagou o café e saiu do café para ser ainda mais redundante. Seguiu pelo emaranhado de lojas num passo decidido. As suas passadas marcavam um compasso pesado, militar, um tudo nada wagneriano. «Mas isto lá é vida para alguém?» cogitava em voz alta através da torrente de pessoas que se afadigavam no consumismo domingueiro. «Olha, mais um!» reparou um jovem que saía dum MacColestrol. «Só querem dinheiro, só dinheiro, mas onde é que isto vai parar?» perguntava-se o homem enquanto agitava o punho com fúria em direcção aos cartazes publicitários. «Queres dinheiro? Pede ao Cotta!» anunciava um outdoor gigantesco junto à rotunda onde dois jovens muito cool exibiam os cartões de crédito às namoradas.
Andou sem rumo algumas horas, pensando na melhor maneira de por fim à sua vida. Mas a desorientação era tal que não conseguia decidir-se, e, entrava e saía dos estabelecimentos sem tomar conta por onde havia passado. Sentou-se numa cadeira perto da linha dos comboios e finalmente determinou:«É mesmo aqui! 'Tá feito e não mexe». Ouviu o som característico do apita-o-comboio, aproximou-se da linha e pôs-se em posição. Ao fundo, como que vinda do nada, a automotora surgiu em toda a sua fúria mutiladora. «É agora!» murmurou o homem. Quando ia fechar os olhos, preparando-se assim para o embate final e subsequente escuridão, vislumbrou um cartaz do outro lado da linha que anunciava: “Agência Funerária DIAS – Porque Há Dias Assim”.

4 comentários:

Marta Says:
29 de julho de 2009 às 21:26

há dias lixados....

El Matador Says:
29 de julho de 2009 às 21:28

Muito lixados.

calamity Says:
30 de julho de 2009 às 17:10

era aínda de dia ou anoitecia?
se fosse comigo, fazia-o à noite...só para lixar a funerária.

P.S. e doava o corpo à faculdade de medicina...por uma questão de humor...negro.

El Matador Says:
30 de julho de 2009 às 18:11

Ahaha. Acho que era lusco fusco. Doar o corpo, pois...o que restasse dele.