O senhor Onofre sonhou
com o dr. Reis toda a noite; onde este o perseguia com os outros
heterónimos e lhe gritava impropérios e o insultava furibundo. Uma descompostura nunca vista, uma humilhação ímpar. Que
mal teria ele feito ao poeta, pois se mal se conheciam.
Abriu a janela do quarto
e sentiu o ar de maresia encher-lhe a casa. Sentou-se à secretária
antes da quebra do jejum e escreveu sem tino:
Vem deitar-te comigo Lídia, à beira
mar.
Massaja-me as têmporas de ressaca que
eu lambo-te as feridas abertas.
O mar molha, de cima abaixo o corpo já
de si húmido, salgado.
Deixa o tempo passar Lídia, à beira
mar, como se o tempo não passasse.
Só existe um tempo à beira mar,
Lídia, Agora.
Vem deitar-te, Lídia, e esquece-te
comigo
descomprometida da história, da vida e
de tudo.
Não era uma homenagem ao poeta, nem
sequer uma qualquer forma baixa de plágio. Era vingança apenas, da
pura: não se persegue um homem assim; uma noite inteira, aos gritos.
6 comentários:
29 de maio de 2012 às 22:39
É bem feito... Grande Onofre! :)
29 de maio de 2012 às 22:58
;)
31 de maio de 2012 às 23:19
A vingança é a Lídia ou a poesia?
31 de maio de 2012 às 23:21
é a poesia.
1 de junho de 2012 às 11:29
Ai... eu adoro, ADORO poesias com nome de mulher...mesmo que o nome não seja o meu. E um poema saído assim do desatino de uma noite insana tem o seu quê de irresistível! =)
1 de junho de 2012 às 11:54
ehehe, o poema é um "assassínio" literário propositado de um outro de Ricardo Reis "Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio".
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