As costas doíam-lhe como se lhe espetassem facas devagarinho; ao mesmo tempo o Presidente da República, com aquele seu ar de quem comeu e não gostou, discursava sobre os sacrifícios da nação, da nacionalidade e das forças armadas. O Primeiro Ministro, com aquele seu ar de quem comeu, gostou e vai repetir, mostrava-se enfadado «Que merda pá! Não se pode sair à rua que começam logo a assobiar». É um facto. O povo não perdoa e os farenses muito menos. O povo gosta de caracóis, de futebol, de cerveja e de assobiar aos altos funcionários da nação. A Avenida Caloust Gulbenkian estava congestionada e na rotunda não se podia passar, mas isso não interessava nada porque ele não se conseguia mexer. Talvez ela tivesse razão, talvez não devesse ver televisão deitado; um músculo atrofiado como um chouriço retorcido atravessava-lhe as costas indo acabar nas 'cruzes'; não tinha posição de pé, nem sentado, nem deitado. Os soldados marchavam todos certinhos e bem ensaiados que era um gosto de se ver «Com uns soldados assim até dá gosto ir p'rá guerra» diria a dona da mercearia mais tarde num ataque repentino de patriotismo bacoco. Os para-quedistas caíam de cima para baixo e alguns há muito que tinham lugar cativo na tribuna de honra. «Se ela ao menos me fizesse umas massagens podia ser que isto passasse» Mas ela tinha ido ver o Sexo e a Cidade com as amigas e por isso tinha mais que fazer. «E eu?» resmungava ele «com estas dores: nem sexo, nem cidade». À entrada do Teatro, algumas pessoas (figurantes contratados) louvaram o primeiro ministro: «Ah! Até que enfim, portugueses de verdade» rejubilou o executivo. Mudou de canal ao mesmo tempo que a dor migrava para o meio dos costados; do Camões nem vê-lo, o que não era de todo importante porque o plantel da selecção já estava completo. Os “Alicópteres” voavam de um lado para o outro e ela nunca mais chegava; depois lembrou-se, como quem se lembra de algo que escapou à lista de compras, que havia mais de cinco anos que não estavam juntos.
4 comentários:
10 de junho de 2010 às 21:29
:) Um dia agitado para os farenses
10 de junho de 2010 às 21:33
Coitados.
11 de junho de 2010 às 17:03
O_o ele há dias assim...
11 de junho de 2010 às 19:04
Há dias maus e dias cabrões, e há cabrões que nem Dias são.
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