Foi desde muito cedo que começou a sentir-se cansado. Um cansaço existencial, que carregava na alma como um fardo, como uma mula de carga. Chegou a questionar-se se não teria já nascido cansado e, toda a sua vida não fosse apenas um consciencializar-se desse facto: um recordar do peso que lhe tinha sido imputado à nascença, como se tivesse nascido já velho; de cansaço, não como o outro do filme. Os budistas acreditam que carregamos no presente o peso cósmico de outras vidas passadas, mas ele não era budista.
O peso do cansaço que trazia na alma reflectia-se-lhe no corpo e toda a sua imagem era uma anúncio ao desalento. Passava na rua com os ombros descaídos, a cabeça baixa fixando a calçada, como se tivesse recebido uma má notícia ou alguém lhe tivesse batido. Quem o via podia sempre dizer: Olha! Ali vai um homem cansado.
Não raras vezes pensou numa forma eficaz de se matar. No entanto, tudo lhe pareceu complicado e doloroso; eram tantos os preparativos e os trâmites a cumprir que, de tão minuciosos lhe tiravam a vontade e cansavam-no ainda mais; por isso sempre que pensava na morte acabava sentado. Foi num desses dias que reparou em algo curioso. Um ambiente pesado gerara-se à sua volta sem que tivesse dado por isso. Havia uma atitude cinzenta nas pessoas que se cruzavam com ele; um mau estar,uma azia, um desgosto; uma cinzentitude que ele conhecia bem e que se podia traduzir numa única palavra: cansaço! Levantou-se e sem saber porquê desenhou um pequeno sorriso de felicidade; começou a andar e seguiu o mesmo caminho de todos os dias, desta vez porém não se sentiu sozinho.
10 comentários:
24 de março de 2011 às 22:30
Cansados andamos todos nós... e mais ficaremos agora com a mudança que se avizinha. Falo obviamente da mudança da hora. No próximo fim-de-semana vamos dormir uma hora menos... :)
24 de março de 2011 às 22:37
A união faz a força.
Belo post, como sempre.
24 de março de 2011 às 23:28
@Luísa: nem eu me lembrei de outra mudança que não a da hora :)
@Desejo: Sim, quase sempre.
25 de março de 2011 às 14:51
E é deveras preocupante quando os cansados/desalentados começam a ser tantos que se passa a aceitar esse estado como normal...
25 de março de 2011 às 15:14
Era aí que eu queria chegar.
28 de março de 2011 às 16:14
Esse gajo era um grande preguiçoso, isso sim :D
28 de março de 2011 às 16:19
Ehehe, é o mais certo.
4 de abril de 2011 às 15:05
porque não há que canse mais do que o cansaço. :-)
4 de abril de 2011 às 15:25
Exacto :)
18 de abril de 2011 às 22:18
Até eu ando cansado!
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